Insegurança alimentar atinge 5,8 milhões de paulistanos, diz pesquisa

São Paulo Mais de 5,8 milhões de pessoas vivem em insegurança alimentar em São Paulo, considerada a cidade mais rica do país. Isso significa que mais da metade da população paulistana precisou reduzir a variedade de alimentos e as porções consumidas. O quadro também faz com que as pessoas pulem refeições ou passem um dia todo sem comer.

Os dados, divulgados nessa quinta-feira (19/9), são do 1º Inquérito sobre a Situação Alimentar no Município de São Paulo.

O levantamento foi feito em parceria entre o Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional (Comusan-SP), o Observatório de Segurança Alimentar e Nutricional da Cidade de São Paulo (Obsanpa) e pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e Universidade Federal do ABC (UFABC).

A pesquisa revelou que 50,5% dos moradores da cidade estão submetidos a algum grau de insegurança alimentar. Na prática, isso significa que essas pessoas não têm acesso regular e/ou permanente aos alimentos que precisam. 

O percentual de São Paulo é quase o dobro da média nacional. De acordo com o IBGE, 27,6% dos brasileiros vivem nessa situação.

O levantamento também mostrou que 1,4 milhão de pessoas de São Paulo (12,5% da população) vivem com insegurança alimentar grave, ou seja, passam fome. Esse total é três vezes maior do que a média do Brasil.

“Nós suspeitávamos que a média de insegurança alimentar de São Paulo seria maior do que a média nacional, mas surpreendeu o quão maior é essa diferença. O senso comum nos leva a achar que a fome está no campo, mas a representação mais fiel da fome é majoritariamente urbana”, disse José Raimundo Sousa, um dos coordenadores da pesquisa, à Folha de S.Paulo.

Pesquisa inédita

Mesmo que o Comusan e o Obsanpa tenham como função auxiliar a Prefeitura na discussão sobre fome e alimentação, este é o primeiro levantamento que detalha a situação da insegurança alimentar na cidade.

O levantamento contratou pesquisadores do Vox Populi, que entrevistaram 3.300 pessoas a partir de um questionário da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar — o mesmo usado pelo IBGE para chegar aos dados nacionais.

As perguntas se referem à percepção e experiência de insegurança alimentar vividas nos três meses anteriores à pesquisa, que foi feita entre maio e julho de 2024. A margem de erro para o total da amostra é de dois pontos percentuais, com nível de confiança de 95%.

“As perguntas captam o grau de segurança ou insegurança alimentar. A primeira delas é se a pessoa teve a preocupação de que os alimentos poderiam acabar antes de ter dinheiro para comprar novamente. A partir daí, as questões aumentam a gravidade da experiência”, explicou Sousa à Folha.

Fome maior nas periferias

Os paulistanos que moram nas periferias da cidade são mais suscetíveis à insegurança alimentar. A pesquisa mostrou que 72% das pessoas que vivenciam a fome em São Paulo vivem nas áreas mais periféricas do município. 

O extremo da zona leste é o que concentra o maior número de pessoas nessa situação:  são mais de 446 mil. Em seguida está o extremo da zona sul, com 297 mil paulistanos passando por insegurança alimentar grave.

Renda

Os dados também mostram que sete em cada 10 domicílios em insegurança alimentar grave na cidade possuíam renda domiciliar per capita de até meio salário mínimo. Os pesquisadores ressaltam ainda que o acesso ao Bolsa Família não garante a segurança alimentar da família.

Isso porque São Paulo tem o maior custo de vida do país, o que faz com que o acesso ao programa nacional não seja suficiente para garantir ao menos a segurança alimentar das famílias, explicou José Raimundo Sousa à Folha.

“Para uma cidade como São Paulo, a política de assistência social talvez tenha que ser mais robusta do que o restante do país por conta do custo elevado”, disse o coordenador do levantamento.

Recorte de raça e gênero

A pesquisa também se desdobrou sobre recortes de raça e gênero para compreender o cenário da fome em São Paulo.

Os dados mostram que, quando a casa é chefiada por uma mulher, a proporção de pessoas em insegurança alimentar grave é 1,8 vez maior do que quando é chefiada por um homem. 

Já quando a pessoa que chefia a família é preta, a proporção é 1,4 vez maior do que em relação aos brancos. Quando é um lar liderado por uma mulher preta, a proporção é duas vezes maior. 

“Gênero e cor são definidores importantes na nossa sociedade, quem ganha menos, têm mais dificuldade de conseguir emprego é também quem sofre mais com a fome”, disse Souza.

O levantamento também questionou os entrevistados sobre os tipos de constrangimentos que a insegurança alimentar causa no dia a dia. 

Considerando aquelas pessoas que vivenciam a fome, 40,4% disseram ter deixado de comprar alimentos para pagar a passagem de ônibus ou metrô, e 38,6% disse ter feito algo que causou vergonha ou tristeza para conseguir comer.

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