Conheça parte das histórias apagadas de Campinas por meio da reconstrução virtual de edifícios do passado. Ao longo da semana, g1 preparou uma série de reportagens para comemorar o aniversário da metrópole. Campinas 250: Inteligência Artificial recria locais do passado que não deixaram registro
A Inteligência Artificial (IA) já é realidade na vida cotidiana e um dos usos que se popularizaram é o de construção de imagens. A partir dessa possibilidade, o g1 conversou com um historiador, uma urbanista e um professor de IA da Unicamp para criar representações de locais do passado de Campinas (SP) que não deixaram registros fotográficos.
Confira, abaixo, como a tecnologia interpretou informações sobre construções históricas de Campinas, como a capela onde foi realizada a primeira missa, além de um cemitério e um hospital do século XIX. O conteúdo faz parte da série de reportagens sobre os 250 anos da metrópole.
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Para o exercício de recriação com IA foram entrevistados:
Américo Baptista Villela, historiador no Museu da Cidade de Campinas;
Ana Villanueva, arquiteta, urbanista, tem pós-doutorado em história pela Unicamp e foi coordenadora do patrimônio cultural de Campinas entre 1989-2002;
Anderson Rocha, professor titular do Instituto de Computação da Unicamp.
🌌 Tecnologia nova, prática antiga
Em Campinas são ao menos dois exemplos importantes de tentativa de recriação de momentos ou construções antigas do passado, antes da chegada da IA.
O primeiro é uma pintura que recria a capela da primeira missa. Um quadro feito por Salvador Caruso em 1946, quase 200 anos depois da construção já não existir mais – e base para a interpretação que a Inteligência Artificial recriar o momento – veja abaixo.
Um fato curioso é que o quadro original que foi retratado em alguns livros e participou de várias exposições, tem, segundo Américo Baptista, o paradeiro desconhecido. No momento, são apenas reproduções da pintura disponíveis.
Salvador Caruso retrata a primeira missa de Campinas em 1774, quadro de 1946
Museu da Cidade de Campinas
A mesma cena já serviu como inspiração para o cartunista Bira Dantas fazer uma charge para o g1 no aniversário de 245 anos da cidade, em 2019.
Tira de quadrinhos representa a formação do povoado de Campinas e a fundação pela 1ª missa
Arte/Bira Dantas
Outro caso relacionado a reprodução de construções históricas ocorreu com a casa de Francisco Barreto Leme, um dos fundadores da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Campinas do Mato Grosso, em 1774.
A sede da sesmaria do século XVIII ficava onde atualmente está o Largo do Café, e como homenagem foi construída uma réplica da residência, em 1972, para abrigar o Museu do Café.
Museu do Café tem acesso limitado, em Campinas
G1 Campinas
🏚️ Edifícios reconstruídos
A partir de descrições deixadas na documentação oficial, fotos e pituras, e com ajuda dos estudos da arquiteta Ana Villanueva, foi possível reunir pistas para tentar recompor, com recursos de Inteligência Artificial, construções perdidas de Campinas. Abaixo estão as reconstruções e os comentários da arquiteta:
Capela primitiva da primeira missa
Reconstrução por Inteligência Artificial da capela primitiva onde foi realizada a primeira missa de Campinas
Anderson Rocha
Os registros referentes a capela onde foi realizada a primeira missa são bem escassos, mas serviram como base para algumas obras artísticas. De acordo com os especialistas, sabe-se que ela era pequena e feita de taipa de mão, com as estruturas de sustentação de madeira aparentes e um teto de palha rústico.
A partir destes registros, Ana Villanueva considera que a reconstrução proposta pela Inteligência Artifical “se revela uma boa representação”.
Cemitério da Irmandade SS Sacramento da Catedral (1861)
Imagem recriada por Inteligência Artificial do Cemitério da Irmandade SS Sacramento da Catedral
Anderson Rocha
Existiam quatro cemitérios localizados na Vila Industrial, em Campinas, na segunda metade do século XIX. Com a expansão da zona urbana, todos foram desativados e os corpos transportados para um novo espaço longe da cidade em 1881, o Cemitério do Fundão, posteriormente chamado de Cemitério da Saudade.
Segundo descrição encontrada no livro “Os Cantos e os Antros”, de Amaral Lapa, o cemitério da Irmandade SS Sacramento da Catedral “tinha forma quadrilátera, cercada por muros de taipa revestidos de telhas, tendo à volta calçadas de pedra, enquanto as ruas internas eram revestidas de ladrilhos atijolados. No centro foi levantado um grande cruzeiro de orindiúba [madeira]”.
Por fim, a descrição histórica aponta que “a entrada era feita por um portão de ferro, sobre cujas colunas ficavam dois globos de louça portuguesa”.
Villanueva considera que o cemitério criado pela IA “também conseguiu atingir uma representação interessante e próxima dos detalhes que foram indicados pelo autor”. “Bem próximo do que poderia ser”, avaliou.
Hospital Variolosos
Imagem recriada por Inteligência Artificial do Hospital dos Variolosos de Campinas
Anderson Rocha
Esse hospital foi criado em meados do século XIX para enfrentar as crises epidêmicas de varíola. Segundo as descrições encontradas nos documentos oficiais e solicitações da prefeitura, “tratava-se de um rancho-hospital de madeira e taipa, coberto de telhas, com cerca de 3,5m a 4m de altura (muro e cume do telhado). Possuia 4 portas com uma janela do lado esquerdo de cada porta”.
A arquiteta Ana Villanueva pondera que a recriação feita pela IA possui “alguma proximidade com o que seria o edifício real, e alguma semelhança com outro hospital da mesma época, que era o Hospital dos Morféticos”.
No entanto, destaca a arquiteta, o Hospital dos Variolosos “era muito mais simples, e de apenas um pavimento”.
💻 Avanços e potencialidades da IA
Professor de Inteligência Artificial na Unicamp, Anderson Rocha explica que a Inteligência Artificial tem avançado como nunca antes, sendo que os maiores destaques a criação de conteúdo tanto de imagens, vídeos e texto, reconhecimentos de imagens, diagnósticos médicos e veículos autônomos, análises preditivas, eficiência e redução de custos em processos, entre outros.
No entanto, ele explica que a dificuldade atual no uso da IA está “ainda na falta de entendimento de senso-comum, interpretação do mundo físico, causalidade” para obtenção de melhores resultados.
“Precisamos incorporar técnicas de aprendizado sem anotações, com dados de qualidade e que entendem causa e efeito. São melhorias importantes para os modelos entenderem melhor o mundo. A incorporação de relações físicas e do mundo normal também será essencial”, avalia.
Ana Villanueva considerou “desafiadora e promissora a ideia de usar inteligência artificial na recriação dia lugares apagados”, e fez observações nessa linha para a melhora dos resultados.
“Acho que devemos dar muitos elementos para que ela possa produzir. Por exemplo: na arquitetura deveria ser feito pelo homem o ‘quadro tipológico arquitetônico’, com elementos da tipologia da época e local. E somente após esta pesquisa chegaríamos em um denominador comum para passar para o trabalho da inteligência artificial”, opina.
De acordo com o professor da Unicamp, para o futuro é esperado que a IA tenha um aprimoramento de modelos, mais eficientes, para gerar textos, imagens e vídeos melhores e reconhecer padrões cada vez mais complexos.
“Precisamos incorporar técnicas de aprendizado sem anotações, com dados de qualidade e que entendem causa e efeito. São melhorias importantes para os modelos entenderem melhor o mundo. A incorporação de relações físicas e do mundo normal também será essencial”, completa.
VÍDEOS: tudo sobre Campinas e região
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