O plano de Zelensky para salvar a Ucrânia de Putin — e de Trump

A Ucrânia está sendo derrotada pela poltronice e pela miopia ocidentais, grandes aliadas russas.

A Rússia já teve 600 mil baixas no fronte ucraniano, entre mortos e feridos, em uma guerra que julgava fácil de ser vencida. Ela avança sobre território ucraniano a um custo pesadíssimo mesmo para a sua enorme capacidade de mobilização. Tanto é que aceitou agregar tropas norte-coreanas, em evidente globalização do conflito.

Como se não bastasse, a Rússia agora se vê obrigada a ir em socorro do ditador sírio Bashar al-Assad, que não pode mais contar com o Irã, derrotado por Israel, para segurar os rebeldes que já tomaram Aleppo, a segunda maior cidade da Síria.

Há também o aspecto econômico. As sanções de Estados Unidos e Europa começam a render frutos bem amargos a Vladimir Putin, e a depreciação do rublo é o seu aspecto mais evidente.

Este seria o momento exato para redobrar o apoio aos ucranianos, mas o Ocidente bate em retirada, como se o aumento do preço da energia e a inflação, efeitos da Guerra da Ucrânia, pudessem ser piores do que a vitória de Moscou sobre Kiev.

Não são, porque Vladimir Putin não se contentará com 20% do território ucraniano. Se essa porção lhe for dada por Donald Trump, em troca de um acordo que garanta a neutralidade da Ucrânia, o ditador russo terá tempo para tomar fôlego e rasgar o acordo, atacando outra vez sobre o país do qual ele não reconhece nem sequer a existência.

Ao contrário do que se pensa nos Estados Unidos, principalmente, o expansionismo russo não ficará restrito à Ucrânia, porque a ambição de Vladimir Putin é declaradamente restaurar o império soviético. A vitória de Moscou sobre Kiev será a derrota do Ocidente inteiro para a Rússia, com todas as consequências funestas que lhe são inerentes. Entre elas, a desestabilização das democracias ocidentais.

A preparação do terreno para entregar a Ucrânia de bandeja a Vladimir Putin passa por enlamear a reputação do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, como se fosse ele, não o algoz russo, o responsável pela manutenção da guerra.

A campanha passou a contar com a participação de Elon Musk, o mais entusiasmado capacho do isolacionista Donald Trump, que usa o algoritmo da sua rede social X para espalhar a calúnia de que o presidente ucraniano usa dinheiro ocidental para enriquecimento pessoal e que, por isso, têm interesse na continuação do conflito.

Acuado pela iminência da posse do novo presidente americano, pela fraqueza interna e pela desarticulação externa cada vez mais patentes dos líderes europeus e por um efetivo humano cada vez mais escasso para repor as tropas que estão no fronte, Volodymyr Zelensky tem um plano de emergência.

Ele disse à Sky News que um convite da Otan para que a Ucrânia integrasse a aliança militar ocidental poderia ser concomitante ao consentimento para que a Rússia mantivesse em seu poder o território que ocupou. Nem a adesão se concretizaria imediatamente, nem a ocupação seria reconhecida como permanente. Seria uma forma de suspender a guerra, na forma de um empate provisório.

Volodymyr Zelensky acredita que um simples convite formal da Otan seria suficiente para impedir que Vladimir Putin prosseguisse no seu plano de anexação e se desse por satisfeito com o território ucraniano que abocanhou, ainda que sem reconhecimento internacional. No cálculo do presidente ucraniano, está também a chance mais à frente de negociação com um líder russo que não seja Vladimir Putin e que, obviamente, não se comporte como ele, seja por convicções, seja por circunstâncias.

O plano de Volodymyr Zelensky é ditado pelo desespero. A ocupação provisória será ocupação para sempre, assim como ocorreu com a Crimeia, um dos capítulos mais vergonhosos da covardia ocidental, que fechou os olhos para a invasão da península, em 2014, abrindo caminho para a agressão russa em 2022. Além do mais, é impossível que o ditador russo aceite a mais remota possibilidade de a Ucrânia entrar na Otan, visto que esse foi alegadamente um dos motivos para a invasão.

O único caminho para a paz e a contenção das pretensões imperialistas russas (e também das ambições na Ásia dos seus aliados chineses, que se estendem em arco que vai das Filipinas ao Japão e têm em Taiwan a joia da coroa) é o Ocidente não se intimidar diante de Vladimir Putin e lhe mostrar os dentes — nucleares, inclusive, em correspondência ao que faz o déspota.

É o que história mostra, como não cansam de repetir abnegados como este pálido colunista de um país periférico a tudo. Mas a história, infelizmente, não é mestra para quem se recusa a ser seu aluno e se refugia na poltronice e na miopia.

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