São Paulo — Todos os caminhos levam ao centro de São Paulo e quem circula pela região sabe que ali está uma grande amostra das falhas e virtudes da capital paulista, um cenário que pautou boa parte dos embates na campanha eleitoral deste ano e que seguirá sendo um grande desafio para quem comandar a Prefeitura paulistana pelos próximos quatro anos.
Se por um um lado o centro conta com vasta oferta de opções culturais, parques, praças, rede consolidada de transporte público e uma infraestrutura urbana impensável em outros locais, por outro é, também, o ponto onde se descortinam graves problemas sociais, impulsionados pela crise na segurança pública.
Estão ali, lado a lado no centro, o icônico Theatro Municipal e a devastadora Cracolândia. O Museu da Língua Portuguesa e pessoas sobrevivendo sob o Minhocão. O vaivém de trabalhadores de diversas regiões da Grande São Paulo e a fila de quem busca um prato de comida no começo da noite. As principais estações de trem e metrô da capital e o lixo nas calçadas.
Para quem vive no local, esse caldeirão de contrastes resulta num prato indigesto, que define os horários em que se pode ou não sair de casa e o tamanho do medo ao dobrar uma esquina.
A fotógrafa Nice Soares, 38 anos, lamenta a insegurança na região central. “Sinto falta de segurança. Moro na Praça Roosevelt e ali tem certos horários em que não é bom passar”, afirma.
Homem segura cachimbo de crack na região central de São Paulo
Em alguns casos, a situação não envolve apenas os roubos e furtos, principalmente de celulares, mas outras circunstâncias que deixam moradores insatisfeitos. “Já presenciei um rapaz querendo bater em uma mulher e a gente precisou intervir para não dar em algo pior”, diz a fotógrafa.
Pugilista e fiscal de mercado, José Aciolly de Barros Filho, 51 anos, cinco deles no centro, diz que a região tem tudo o que morador precisa. Mas também uma série de problemas que coloca em risco a vida de quem circula por lá.
Passageiros aguardam trem na Estação da Luz, na região central de São Paulo
Para Barros, o que precisa melhorar é a segurança. “Tanto durante o dia quanto à noite. Tem sempre uma esquina com alguém esperando para roubar o trabalhador. O trabalhador é quem sofre mais, principalmente nos semáforos, porque, quando fecha, os caras aproveitam para roubar ou furtar o celular do motorista”, diz
O fiscal descreve cenas que presenciou. “Em cinco anos que estou por aqui, o que mais vi foi pessoa roubando trabalhador, mãe com filho no colo. Os caras não respeitam ninguém”, afirma.
Os números corroboram a sensação de quem vê o centro como um lugar inseguro, mesmo sendo a região mais policiada da capital paulista.
Vista da Avenida Paulista, em São Paulo
18 mil roubos em 5 anos
Levantamento realizado pela Polícia Militar (PM) mostra que bairros do centro são aqueles com maior taxa de furto e roubo de celular por 100 mil habitantes. Na República, por exemplo, que engloba parte da Cracolândia, foram mais de 18 mil registros de roubo entre 2019 e 2023.
Outras estatísticas de criminalidade reforçam o clima de insegurança. A Sé tem uma taxa de homicídios de 11,2 para cada 100 mil habitantes, segundo a Rede Nossa São Paulo, quase três vezes a média da cidade, que foi de 4,01 em 2023. É também o bairro que lidera o ranking de violência contra a mulher entre os 96 distritos da capital paulista.
Pessoas em situação de rua sob o Minhocão, na Santa Cecília, região central de São Paulo
Os problemas sociais também são evidentes. A região central tem os três bairros da capital com maior número de pessoas em situação de rua: Santa Cecília, Sé e República. No primeiro, por exemplo, são mais de 5 mil dormindo nas calçadas.
Todas essas mazelas estão concentradas em uma região que conta com as maiores densidades populacionais da cidade, chegando a 26 mil habitantes por km² na República.
Moradia e mobilidade
A despeito de todos os problemas, muitas pessoas ainda querem viver no centro. É o caso do ator Daniel Melotti, 31 anos. “A acessibilidade é o melhor. É perto de tudo, dá para fazer muita coisa a pé morando aqui no centro”, diz. Ele cita, ainda, o fato de os prédios antigos da região serem mais espaçosos do que os modernos. “A desvantagem é que está encarecendo muito”, afirma.
Melotti diz, contudo, que os pontos positivos não encobrem a violência urbana. “Meu celular foi roubado. Demorei anos para comprar, roubaram no Minhocão, que é um lugar onde a gente acha que está em um parque.”
Pessoas na fila da distribuição de comida em São Paulo
Também ator, André Sun, 32 anos, estava procurando apartamento com Melotti ao conversar com o Metrópoles e disse que a segurança é um fator primordial na escolha. “De um quarteirão para o outro, pode ficar muito mais perigoso”, afirma.