Na eleição municipal de São Paulo, a disputa será entre a direita dos pobres e dos remediados que aspiram a não ser pobres e a esquerda dos ricos e da classe média que aspira a ser rica. O candidato do primeiro pelotão é Ricardo Nunes; o candidato do segundo é Guilherme Boulos.
Como manda a necessidade didática do jornalismo, generalizo e caricaturo, sem completo descolamento da realidade, o resultado da última pesquisa do Datafolha. Ricardo Nunes lidera entre os eleitores com renda familiar de até dois salários mínimos, com 31% das intenções de voto, onze pontos percentuais a mais do que Guilherme Boulos, com margem de erro de cinco.
O cenário se inverte quando o universo é dos eleitores com renda familiar acima de 5 salários mínimos: 34% deles declaram voto em Guilherme Boulos, contra 22% em Ricardo Nunes, dentro da mesma margem de erro.
Guilherme Boulos esperava que o apoio de Lula lhe desse um empurrão entre os mais pobres. Não deu. Lula já não é mais o mesmo desde que passou a usar relógio Cartier e gravata Hermès.
A transação bem-sucedida para que a ex-prefeita Marta Suplicy, rica com algum prestígio entre os pobres, fosse a vice na chapa de Guilherme Boulos também não surtiu efeito. De acordo com a pesquisa do Datafolha, o companheiro do intrépido PSol levaria uma sova de Ricardo Nunes no segundo turno. Perderia por 52% a 37%.
A esperança de Guilherme Boulos era que Pablo Marçal passasse ao segundo turno. Seria a sua chance de vencer a eleição. Mas Pablo Marçal encolheu desde que levou a cadeirada de José Luiz Datena. Por incrível que pareça, até na política brasileira picaretagem tem limite (de vez em quando).
A cadeirada fez com que Jair Bolsonaro abandonasse a ideia de apoiar Pablo Marçal e voltasse à sua mornidão como aliado de Ricardo Nunes. Ele já ajuda bastante se não atrapalhar que os votos dados ao coach no primeiro turno se encaminhem naturalmente para a reeleição do atual prefeito.
Como analistas políticos têm de fazer análise política, eles são obrigados a extrair alguma lógica no comportamento dos eleitores paulistanos. A lógica não é complicada: uma porção dos ricos e da classe média que aspira a ser rica vota em Guilherme Boulos movida pela má consciência, resquício da doutrinação nas escolas de elite dominadas pela esquerda. Há, ainda, a pura rejeição a qualquer coisa que se associe a Jair Bolsonaro, como se ele fosse o mal maior.
A porção de pobres que torce o nariz para Guilherme Boulos e vota em Ricardo Nunes tem a percepção de que o candidato lulista tem um passado que o condena. Esse negócio de ter ficado do lado de quem invade propriedade alheia não pega bem entre quem está comprando ou conseguiu comprar uma casinha com o suor do seu trabalho. A rejeição a Lula conta também, visto que o salário está cada vez mais longe do final do mês. Inflação de pobre é sempre maior.