Local oferece condições ‘privilegiadas’ para os atletas da Baixada Santista, mas especialistas afirmam que a prática do esporte na região é arriscada devido às fortes correntezas. Surfista Douglas Noronha ‘pegando onda’ na Garganta do Diabo, em São Vicente (SP)
Sidão Lopes
Não é segredo que o litoral de São Paulo abriga lugares paradisíacos, com destinos especiais que incluem as famosas praias. Entre a Ilha Porchat e o Parque Estadual Xixová-Japuí, em São Vicente, está um deles: a região marítima conhecida como Garganta do Diabo. Embora o nome gere estranheza à primeira vista, moradores concordam que o apelido faz jus à fama “perigosa” do local.
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O g1 noticia anualmente casos de acidentes fatais no mar da Garganta do Diabo – sem deixar de lado os que, por pouco, não viraram tragédia. Em 2017, por exemplo, uma jovem de 18 anos e o piloto de uma moto aquática foram resgatados por um PM após ficarem à deriva durante um passeio na região.
Segundo os oceanógrafos Henrique Chaves e Renan Ribeiro, na Garganta do Diabo há bancos de areia que se movimentam ao longo do tempo. De acordo com eles, no local existe uma correnteza forte em função do “efeito de maré e estrangulamento da água”, que proporcionam ondulações arriscadas tanto para o ser humano quanto para embarcações.
Além dos perigos ‘ocultos’, outro mistério que paira sobre as águas é o apelido popular. Sergio Willians, presidente do Instituto Histórico Geográfico de Santos, contou que diversas lendas urbanas explicam o nome, incluindo a de que o local “engolia” barcos que ousavam passar por lá. Para ele, a hipótese que mais faz sentido pode ser, literalmente, desenhada (veja abaixo).
Afinal, de onde veio o nome?
Baía de São Vicente e Ilha Porchat
Carta náutica da Marinha
Sergio Willians destacou que há uma crença popular de que a Garganta serviu de passagem para as caravelas de Martim Afonso na fundação da Vila de São Vicente. Para ele, porem, a ‘informação’ não procede devido à falta de embasamento histórico.
Segundo contou que o pintor Benedito Calixto criou telas para mostrar as caravelas chegando pela primeira vez à baía municipal no século XVI. A ciência já comprovou, no entanto, que navios de grande porte não passariam pela Garganta devido às condições naturais da região. O desembarque das embarcações ocorreu, na verdade, próximo à Ponta da Praia, em Santos.
“Se você pega o mapa da baía de São Vicente, entre a Ilha Porchat e a Ponte Pênsil, o desenho dessa baía no trecho de água lembra a cabeça de um diabo. A parte da Ilha Porchat é onde ficaria a garganta”, explicou ele.
Sérgio Ujvari surfando na Garganta do Diabo em 2023
Dinho Imagens
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Surfistas
Para o aposentado e juiz de campeonatos de surfe, Sérgio Ujvari, de 66 anos, a Garganta do Diabo pode ‘presentear’ o atleta com as “melhores ondas que você vai pegar na vida” ou também o representar o “seu pior pesadelo”.
Há quatro anos, Ujvari foi surpreendido pela força do mar e jogado para baixo enquanto se aventurava pela Garganta do Diabo. O resultado foi uma prancha quebrada ao meio e o desespero para escapar das ondas.
“Conhecendo o local, sabendo das correntes, é tranquilo surfar lá. Mas muitos surfistas vão sem saber nada, pensando que estão numa praia normal, só que não. Tem que saber onde vai, respeitar o mar e sempre manter a calma”, explicou Ujvari.
Assim como Sérgio Ujvari, o jornalista e advogado Daniks Fischer, de 51 anos, costuma ir à Garganta do Diabo para pegar onda. Ele frequenta o local há cerca de 37 anos, e foi lá que adquiriu a ‘base’ para surfar no famoso arquipélago estadunidense do Havaí.
“É sensacional! Surfar lá é como estar surfando numa bancada gringa de ondas grandes. A gente fica distante da costa, mas ao mesmo tempo perto da Ilha Porchat, o que traz um charme e uma adrenalina especial ao local”, disse ele.
Apesar do ‘sentimento de aventura’, os riscos aos atletas que surfam na Garganta não devem ser ignorados. “É bem perigoso mesmo, com muita corrente e redemoinhos. Inclusive, já ajudei a tirar algumas pessoas de lá em situação de perigo”, ressaltou Daniks Fischer.
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Surfista profissional, Douglas Noronha, de 35 anos, também aproveita o mar da Garganta do Diabo desde a adolescência. Ele destacou que é importante não baixar a guarda, especialmente quando o mar está de ressaca [elevação anormal no nível das águas].
“Não é tranquilo surfar lá, precisa de uma certa experiência em ondas maiores e conhecimento do local, como as variações de maré. Precisa também de pranchas maiores do que as que estamos acostumados a usar no dia a dia”, explicou Noronha.
O surfista natural de Santos (SP) disse que nunca se acidentou na Garganta, mas já presenciou alguns acidentes e “perrengues” de amigos e conhecidos no local.
Douglas Noronha surfando na Garganta do Diabo, em São Vicente (SP)
Celso Ferreira
Oceanógrafos
De acordo com o oceanógrafo Renan Ribeiro, a principal questão envolvendo a Garganta do Diabo é a ondulação do mar. Segundo ele, há basicamente dois grandes bancos de areia: olhando para a cidade, um fica do lado direito, já o outro está do lado esquerdo, próximo à região do Xixová-Japuí.
O oceanógrafo explicou ao g1 que a correnteza é forte devido ao ‘estrangulamento’ que há na região. A água também ganha aceleração devido à passagem da maré pela baía de São Vicente para a de Santos.
“Dependendo da condição de onda que a gente tem, principalmente quando tem mar mais agitado, tem a formação de ondas maiores”, afirmou.
Garganta do Diabo em dezembro de 1991, quando uma embarcação naufragou e três pescadores morreram
Arquivo/A Tribuna Jornal
O também oceanógrafo Henrique Chaves acrescentou que a Garganta recebe um forte aporte de água do desague da Serra do Mar, cadeia montanhosa que vai do Estado do Rio de Janeiro até o norte do Rio Grande do Sul.
“Alguns surfistas já foram arrastados para alto-mar, aí tiveram que sair nadando para o lado de São Vicente, pro Itararé, para poderem se salvar. Ou então, surfistas já foram parar na Ponte Pênsil”, ressaltou o especialista.
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