O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu, nesta quarta-feira (19/6), interromper o ciclo de cortes da taxa básica de juros do país, a Selic, iniciado em agosto de 2023. Com a decisão, a Selic será mantida no atual patamar de 10,50% ao ano até a próxima reunião do órgão, marcada para os dias 30 e 31 de julho.
A medida era amplamente esperada pelos agentes econômicos, embora alguns deles ainda acreditassem em um eventual corte de 0,25 ponto percentual dos juros básicos. Mas, segundo dados de terça-feira (18/6), 93,5% dos investidores apostaram na manutenção da Selic em 10,50%, no mercado de Opções de Copom, da Bolsa brasileira (B3).
Trajetória agitada
A trajetória da Selic registrou ascensões e mergulhos vertiginosos nos últimos quatro anos. Entre 6 de agosto de 2020 e 18 de agosto de 2021, ou seja, por um ano, ela permaneceu no patamar minúsculo de 2%, o mais baixo desde novembro de 1997.
A partir daí, só fez subir até alcançar 13,75% ao ano, em 4 agosto de 2022, puxada pela crise da pandemia. Um ano depois, em 3 de agosto de 2023, o Banco Central iniciou o ciclo de queda, com seis cortes seguidos de 0,50 ponto percentual, até que a Selic chegasse a 10,75% em março de 2024. Em maio, o Copom diminuiu o ritmo das reduções, promovendo uma queda de 0,25 ponto percentual. Na ocasião, a Selic chegou aos 10,50%.
Cenário de incertezas
O Banco Central justifica a interrupção do ciclo de queda dos juros como o aumento de incertezas tanto no ambiente econômico interno como externo, o que poderia levar a um recrudescimento da inflação no Brasil. E o BC tem como missão básica controlar o aumento de preços e garantir o cumprimento da meta de inflação, com centro fixado em 3% ao ano.
No cenário externo, o grande dilema econômico concentra-se no comportamento dos juros nos Estados Unidos, que estão no intervalo de 5,25% e 5,50%, o valor mais alto desde 2001. Nesse nível, os títulos da dívida americana, os Treasuries, tornam-se especialmente atrativos para os investidores, algo que provoca, entre outros problemas, pressão de alta sobre o dólar nos países emergentes, como é o caso do Brasil.
Força dos EUA
O problema é que a economia americana não para de dar sinais de aquecimento. Isso é bom para as pessoas e empresas, mas pode ser ruim para a inflação. Com isso, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) está empurrando para uma distância cada vez maior a execução do primeiro corte dos juros no país.
No fim do ano passado, o mercado acreditava que essa redução poderia ocorrer em março. Agora, essa expectativa foi adiada para setembro, ou mesmo, para dezembro. O que todos sabem é que o Fed não vai desistir de manter os juros altos, enquanto a inflação não cair para a meta de 2% (agora, ela está em 3,3%).
Até recentemente, os conflitos no Oriente Médio, entre Israel e o Hamas, e na Ucrânia também estavam no radar do BC como ameaças à estabilidade da economia global – e, portanto, dos preços internacionais. Esse fator perdeu força desde a última reunião do Copom, nos dias 7 e 8 de maio.
Afrouxamento fiscal
No ambiente interno, segundo a avaliação dos agentes do mercado, também não faltam interrogações. Elas ganharam força com o anúncio do afrouxamento da meta fiscal (a relação entre receitas e despesas da administração federal) para 2025 e 2026, feito pelo governo em abril.
Dúvidas sobre o comportamento dos preços dos produtos no Brasil, notadamente os agrícolas, também aumentaram com a calamidade provocada pelas chuvas no Rio Grande do Sul. A inflação de alimentos tem sido uma preocupação recorrente do BC.
A força do setor de serviços no país é outro ponto que tem causado temores no que diz respeito ao aumento dos preços. Além disso, questões paralelas como a interferência política na Petrobras, ajudaram a criar turbulências no cenário interno.
Risco da inflação
Diante desses fatores, os internos e os externos, as projeções para a inflação no Brasil não param de crescer, como mostra o Relatório Focus, a pesquisa semanal realizada pelo BC com agentes do mercado. Na última edição do boletim, divulgada na segunda-feira (17/6), a estimativa para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para 2024 chegou a 3,96%. Isso depois de seis elevações seguidas da previsão. Para 2025, o IPCA foi a 3,80%, após sete aumentos consecutivos.
No fim de maio, a estimativa de inflação para 2026 foi alterada para cima pela primeira vez depois de 46 semanas sem registrar qualquer mudança – ou seja, um período de quase um ano. Nesse caso, ela passou de 3,50% para 3,58%. Agora, já está em 3,60%. Tais projeções fazem com que a inflação, no linguajar do BC, fique “desancorada”, ou seja, entre numa trajetória que a afaste da meta.
Reuniões do Copom
O Copom é formado pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto, e pelo corpo de oito diretores do órgão. O colegiado reúne-se a cada 45 dias em duas sessões. No primeiro encontro, são realizadas apresentações técnicas sobre a evolução e as perspectivas da economia, notadamente sobre o comportamento da inflação, das contas públicas e do cenário externo. No segundo, é definido o valor da taxa Selic. Em 2024, o órgão do BC realizará mais quatro reuniões.