Civis foram feitos de laranjas por militares em operação que tinha o objetivo de matar o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Investigação da Polícia Federal apontou que os kids pretos usaram telefones frios em nome de terceiros para ocultar quem estava verdadeiramente por trás da trama. Uma das pessoas que servia como potencial disfarce foi um candidato a vereador em um município do Rio de Janeiro. Ele disputou as eleições em 2020, quando conquistou apenas 43 votos, mas foi o suficiente para ter o cargo de suplente pelo partido Cidadania.
Antes de ser candidato, o homem foi dono de uma pizzaria que funcionou durante anos no mesmo município em que ele se candidatou. Os dados do empresário foram usados para habilitar duas linhas telefônicas que tiveram participação efetiva no plano. O Metrópoles tentou contato com ele, mas não teve resposta. Por esse motivo, não vai identificar quem é o apontado, que não tem qualquer envolvimento com os crimes praticados pelos oficiais do Exército Brasileiro.
O nome do grupo que tramava as ações era Copa 2022 e, para aumentar o disfarce, os militares usaram codinomes de países que disputaram o mesmo campeonato esportivo. Os apelidos adotados foram: Alemanha, Argentina, Áustria, Brasil, Gana e Japão.
Segundo a investigação da Polícia Federal, o nome do candidato a vereador foi bode expiatório para as linhas de celulares usadas pelos codinomes Brasil e Gana. Até o momento, não foi possível decifrar qual codinome estaria atribuído para cada militar.
Com a linha em nome do ex-empresário, Gana e Brasil eram administradores do grupo, já que em uma troca de mensagem um dos integrantes pede a eles para ser adicionado no Copa 2022. O grupo foi formado em 15 de dezembro de 2022, no mesmo dia em que o plano para prender e, possivelmente, matar Alexandre de Moraes seria colocado em prática.
Brasil é quem fica estacionado em frente a um restaurante no Parque da Cidade esperando as ordens dos demais envolvidos. O trajeto do parque pode ser usado como deslocamento de Moraes do STF até sua casa, no final da Asa Sul, em Brasília.
Já Gana destaca em mensagens que está na “posição” planejada e Brasil pergunta sobre a conduta a ser tomada. Neste momento, o líder do grupo teixeiralafaiete230 (também chamado de “Alemanha”) informa que os dois devem aguardar.
Como o Metrópoles revelou, Lafaiete Teixeira também foi um laranja usado pelos militares. O nome dele aparece após ter se envolvido em uma batida de trânsito na BR-060, a 600 metros do restaurante Sete Curvas, que fica em Santo Antônio do Descoberto – região do Entorno do DF. O tenente-coronel Rafael de Oliveira que estava no carro que colidiu contra o de Lafaiete em 24 de novembro daquele ano.
Após o acidente, sob a justificativa de lidar com os trâmites burocráticos da batida, Oliveira fotografou a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) de Lafaiete e o Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV). Ele usou as informações para habilitar a linha no nome de Lafaiete em 8 de dezembro de 2022 – uma semana antes do plano de homicídio.
Assim como Lafaiete e o ex-candidato, os militares usaram o nome também de um réu em acidente de trânsito. O homem foi apontado por ter causado a morte em um acidente em Alagoas em 2021. Duas pessoas foram vítimas no caso.
O processo culposo – quando não há intenção em matar – está suspenso, porque o acusado e sua defesa não foram localizados para responder pelo crime.
Ainda que não tenha sido encontrado pela justiça alagoana, o homem de 45 anos teve seus dados usados pelos militares como blindagem na ação golpista. No grupo Copa 2022, no aplicativo Signal, a linha com o nome do réu era “Argentina 2”.
Todas as linhas foram compradas no mesmo dia e na mesma loja: uma filial das Americanas em Uberlândia (MG) em 3 de dezembro de 2022. Todos os prefixos, também, tiveram o primeiro uso em 8 de dezembro no Núcleo Bandeirante (DF).
Uma das linhas que tinham sido habilitadas no nome do ex-candidato foi usada no mesmo aparelho que o tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo usou em 29 de dezembro. A informação foi possível após levantamento do número de IMEI no aparelho que tinha sido usado na mesma linha que o militar com codinome Brasil.
“Ou seja, nove dias após a ação clandestina para, possivelmente, prender/executar o ministro Alexandre de Moraes, o telefone de IMEI foi associado ao telefone cadastrado em nome de Rodrigo Bezerra”, destaca relatório da PF.
Na época das ações, Bezerra era major de infantaria que servia no Comando de Operações Especiais do Exército Brasileiro. Ele e Rafael Martins faziam parte do grupo “…Dossss!!!!”, que era administrado pelo tenente-coronel Mauro Cid.
Em 30 de dezembro de 2022, no mesmo dia que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deixou o país, Rodrigo Bezerra saiu do grupo administrado por Cid, dizendo que o grupo perdeu a finalidade.
Mensagem de Rodrigo Bezerra
No texto, o tenente-coronel destaca que os militares “fizeram o que podiam para honrar o próprio nome e as Forças Especiais”.
“Nesse sentido, ressalta-se a identificação de ações com emprego de técnicas e militares com formação em Forças Especiais do Exército para propiciar a consumação do Golpe de Estado em execução pelos integrantes da organização criminosa ora investigada”, destaca a investigação da PF.
Operação Contragolpe
A Operação Contragolpe, deflagrada pela Polícia Federal nessa terça-feira(19/11), foi autorizada por Alexandre de Moraes. A ação visa desarticular organização criminosa que teria planejado golpe de Estado em 2022 para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Presidência da República e atacar o STF.
Segundo a PF, havia um planejamento operacional, denominado “Punhal Verde e Amarelo”, para matar Lula e seu vice, Geraldo Alckmin, e o ministro Alexandre de Moraes.
A operação mira os “kids pretos”, que seriam militares da ativa e da reserva. Além deles, um policial federal foi preso.
Um dos alvos é o general da reserva Mário Fernandes, que foi secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência no governo Jair Bolsonaro e assessor do deputado federal Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde de Bolsonaro, até março deste ano.
A Polícia Federal (PF) revelou que o general, preso na Operação Contragolpe, incluiu, no documento denominado “Punhal Verde e Amarelo”, quais munições seriam usadas no plano para matar Moraes.
“Kids pretos” presos:
tenente-coronel Helio Ferreira Lima;
tenente-coronel Rodrigo Bezerra Azevedo;
tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira; e
policial federal Wladimir Matos Soares.
Arsenal
Segundo a PF, “a lista com o arsenal previsto revela o alto poderio bélico que estava programado para ser utilizado na ação”.
“As pistolas e os fuzis em questão (‘4 Pst 9 mm ou .40′ e ‘4 Fz 5,56 mm, 7,62 mm ou .338’) são comumente utilizados por policiais e militares, inclusive pela grande eficácia dos calibres elencados”, revela a corporação.
A Polícia Federal destaca, ainda, que o arsenal previsto é composto de “armamentos de guerra comumente utilizados por grupos de combate”.
Ainda de acordo com a PF, a primeira arma listada era uma M249, “metralhadora leve altamente eficaz, projetada para fornecer suporte de fogo em combate”.
A segunda era uma arma projetada para disparar granadas de fragmentação ou munições especiais de 40mm, “que fornece capacidade de fogo indireto e versatilidade em termos de tipos de munição”.
E, por fim, o terceiro armamento era AT4, um lança-rojão utilizado “principalmente por forças armadas e de segurança para combate a veículos blindados e estruturas fortificadas”.
Lista de itens previstos
Seis coletes à prova de balas;
12 granadas;
Quatro pistolas;
Rádios de baixa frequência;
Seis telefones celulares descartáveis;
Quatro fuzis com munição não rastreável;
Uma metralhadora, um lança-granadas, um lança-rojão, também com munição não rastreável.
O “Punhal Verde e Amarelo” detalhou que seriam necessárias seis pessoas para a execução pretendida, de acordo com o “Copa 2022”, nome dado pelos investigados ao plano de matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes.
O documento ainda versava sobre a análise de riscos e impactos da ação, com a possível ocorrência de “baixas aceitáveis”.