São Paulo — A Avenida Dona Belmira Marin, a principal do Grajaú, na zona sul paulistana, expõe um catálogo de erros no transporte público municipal de São Paulo. A superlotação é tanta que as portas não fecham completamente, ônibus param fora dos pontos, circulam sem identificação ou cruzam sinal vermelho para fugir de passageiros em fúria, que aguardam até seis coletivos ou mais de uma hora para conseguir embarcar.
O desespero das pessoas para chegar em casa depois de um dia de trabalho aumenta conforme os ônibus atravessam a altura do número 1.000 da Belmira Marin, no bairro mais populoso da capital paulista. Os coletivos já vêm lotados desde o Terminal Grajaú e, após dois pontos de parada, com tanto peso, têm dificuldade até para vencer a primeira ladeira rumo a ruas e vielas que ficam nas beiradas da cidade, a 30 km da Praça da Sé, na região central, Marco Zero da cidade.
O Metrópoles presenciou, na última terça-feira (19/11), diversas tentativas frustradas de embarque e reações que vão do desconsolo à raiva por parte de trabalhadores exaustos no fim do dia.
O oficial de manutenção Geison Fernando de Souza, 38 anos, era mais um à espera do ônibus. Estava atrasado para pegar o filho na creche, mas não por culpa própria. “Estou aqui há 52 minutos. Tive que pedir para outra pessoa pegar, porque não vou chegar a tempo”, afirmou.
Depois de conversar com a reportagem, Geison ainda levou mais 35 minutos para embarcar, isso porque se espremeu para cruzar a porta. O desconforto é rotineiro, relata. “Um ou outro ligam o ar condicionado, só quando chegam perto do terminal ou do ponto final, porque deve ter alguma fiscalização. Geralmente, eles vêm superlotados e abafados, então fica difícil”, afirmou. O oficial de manutenção saiu de casa às 5h30, ainda na madrugada.
Alguns demonstram resignação, mas outros se revoltam. É o caso da doméstica Maria Cardoso Oliveira, 43 anos. “Tem gente, mas não tem ônibus”, disse. “Vixe, Maria, já tem meia-hora parada ali, ó. Meia-hora, nesse inferno”, afirmou.
A cuidadora Rita Rabelo, 63 anos, retornava de uma jornada de trabalho na Avenida Pacaembu, na zona oeste, a mais rica da cidade. Ela chama a atenção da reportagem para o fato de os ônibus lotados pararem a 50 metros ponto como forma de evitar novas tentativas de embarque.
“Dei com a mão e não abriu a porta. É a humilhação, a humilhação”, afirma moradora do Grajaú que espera até 6 ônibus para embarcar. “E falam que tá bom, falam que tá bom”, disse.
Os transtornos atingem também os motoristas das linhas que cruzam o Grajaú. Em alguns casos, eles próprios lamentaram a situação e o desgaste provocado pela superlotação dos ônibus.
No ano passado, a prefeitura subsidiou o transporte público municipal com cerca de R$ 5,3 bilhões. Neste ano, a previsão é de que o subsídio seja ainda maior.
O que diz a prefeitura
A Prefeitura de São Paulo afirmou, por meio da SPTrans, que, desde 2021, a atual gestão implantou 54 km de faixas exclusivas, superando a meta de 50 km prevista no Plano de Metas para até 2024. A SPTrans também disse que monitora continuamente a movimentação dos usuários para ajustar a oferta de transporte.
“Entre 2019 e 2024, a demanda diária de passageiros caiu de 9 milhões para 7,3 milhões, ou seja, 80% do patamar pré-pandemia. A frota operacional, por sua vez, conta atualmente com 12.042 veículos, 94% do nível pré-Covid-19”, diz, em nota.
O Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiro de São Paulo (SPUrbanuss) afirma que as empresas operadoras do transporte urbano de São Paulo são contratadas para a prestação do serviço. “Assim, devem atender as determinações da administração municipal no que diz respeito ao número de ônibus em operação, tipologia da frota (diesel, elétrico, Padron, articulado, trólebus…), horários e itinerários”, diz, em nota.